E então ele apareceu.
Amigo do anfitrião, trocámos olhares, e foi mágico, e quando apertámos as mãos a eletricidade estática fez disparar o meu coração com uma intensidade que eu nem sabia possível, enquanto descobríamos que tínhamos imensos interesses em comum, e nos sentávamos a discutí-los na rua, longe do barulho, e da história de como a Ana Cláudia dos recursos humanos pintou o cabelo de ombré e lhe fica muito mal.
Pediu-me número de telefone ao meu amigo, e qual gentleman, enviou-me poemas românticos, convidou-me para jantar, e depois no caminho para casa trocámos um longo primeiro beijo, e soube ali que me tinha apaixonado loucamente.
... Vá lá, sabemos todos que isto não aconteceu.
Afinal, É de mim que estamos a falar.
Portanto, o rapaz apareceu, fomos apresentados, era atraente, falámos cinco minutos, eu disse algumas piadas maldosas, fiquei ali baptizado de bicha má, fui pedir outra vodka, fui dançar e nem me lembrei mais dele.
Passou-se um ano, muita água pela ponte, e alguns homens pela cama, até voltar a ver o rapaz.
cruzámo-nos na rua, e quando dei por ela, tinha o meu amigo a dizer-me que o rapaz lhe veio perguntar por mim, extremamente interessado.
Portanto, teve 365 dias para maturar o interesse, como qualquer pessoa normal faz, afinal é assim que as coisas funcionam hoje em dia, ou se dá uma queca no primeiro encontro, ou se espera um ano para meter conversa, vá-se lá entender estas bichas modernas.
Começaram a chover elogios.
Sendo eu um Leonino, isto nem deveria ser problema, não fosse o ridículo de ouvires aquelas linhas cliché de quem te quer saltar para a cueca a serem debitadas mais depressa do que um relato de futebol no rádio.
Dizia me que eu era especial e sexy, e que parecia diferente dos outros - informações que claramente conseguiu assimilar em cinco minutos de conversa há doze meses atrás
- mas que me tinha achado muito arrogante quando nos conhecemos - novamente, provavelmente adquirido de cinco minutos de conversa, o rapaz devia fazer parte do cast do mentalista, ou assim.
Conversa trivial jogada fora, e subitamente aterramos no Zodíaco.
E eu adoro astrologia, mas nunca quando o resultado é:
"Oh, és do signo do meu ex, os leões são uns falsos"
isto a juntar à genial decisão de insultar o gajo a quem estás a passar a asa, levou-me a ir buscar um balde de pipocas, para assistir ao rumo que a conversa iria tomar.
Valeu imenso a pena.
Disse me que procurava o amor e que queria pessoas diferentes - cantada nota mil, diga-se de passagem - mas que o destino tinha sido cruel e não tinha sorte.
"É que eu tenho um problema"
"Ai sim?"
"Sim"
"Qual é?"
"Tenho uma pila muito grande"
E em cinco segundos o meu telemóvel era invadido pelo rapaz - que eu só tinha visto uma vez naquela noite, aqueles cinco minutos - nu, de benga na mão e cara de boi cobridor.
Ainda mal eu tinha tido tempo de processar a imagem - que por acaso correspondia á descrição - e já era presenteado com a seguinte frase.
"É que as putas querem pilas grandes, os meninos sérios não"
Por esta altura eu estava a ponderar se lhe aconselhava a seguir uma carreira no stand up, porque me estava a arrancar imensas gargalhadas, quando a história toma proporções emocionais dignas de uma sonata, ou uma balada da Adele.
"O meu ex acabou comigo por causa disso"
"... Por causa da pila?"
"Sim e porque tinha medo de se apaixonar mais"
"Ah... pois" (Fica a Dica, falar do ex quando queres saltar na cueca de alguém é tipo regar uma plantação de milho com gasolina.)
"És tu homem para me amar, mesmo com a pila grande?" (Porque aparentemente, ter uma jibóia cega, é o mesmo que casar com alguém com um tumor cerebral, é preciso muito amor e dedicação para lidar com isso.)
Por esta altura estava com a clara sensação que estava dentro de um filme porno, e que a qualquer momento todo o ambiente ao meu redor ia ficar a meia luz, e ao fundo aquela música de saxofone ia tocar enquanto ele aparecia de pirilau na mão para alegadamente me enrabar até ao sol raiar - e se rimou era claramente verdade.
Completamente constrangido com a conversa, tentei mudar o assunto, mas a conversa oscilava entre a genitália do mancebo, e o ex que lhe deu um par de patins.
Quando lhe perguntei se a coisa tinha sido muito séria, recebi um
"Chorei e gritei muito, estou a morrer por dentro mas já passou, sou forte"portanto, nessa uma semana, veio meter conversa de engate comigo, mesmo estando "a morrer por dentro" uma história surpreendente de superação emocional, Equiparável à das vitimas do tsunami no Haiti.
"Acabaram quando?"
"Há uma semana, então resolvi começar à procura de um homem bom e honesto"
Ficou até hoje à espera que lhe diga quando quero combinar um café, ou "qualquer coisa".
Cada vez que o encontro na rua, lembro-me desse café, carinhosamente marcado para dia de são nunca, de manhã, só para variar.
E se fosse com vocês?