A cura gay

quinta-feira, 27 de março de 2014



Acabei de ver um documentário do channel 4, “Undercover doctor - Cure me, I'm gay, (que recomendo a quem gostar do género)

Basicamente, seguimos Christian Jessen, um doutor, homossexual assumido – e confortável com isso - , que resolveu submeter-se a diversas “curas” para a homossexualidade que existem em cada vez maior número nas comunidades religiosas americanas e britânicas, para mostrar o que os gays passam para se “curarem”, e se tornarem felizes e realizados "Ex-gays" com mulheres e filhos.
E o que vi indignou-me.

Desde exorcismos, a terapias de choques, passando por repressão e “reabilitação” dos “impulsos errados” viu-se um pouco de tudo o que a sociedade em pleno século XXI tem para oferecer ao gay em busca de "tratamento" nos 47 minutos de documentário.

Os “pacientes” entravam nessas terapias, algumas muito cientificas no papel – mas verdadeiros contos do vigário em boa realidade – assustados e desesperados por mudar, enquanto pagavam fortunas a verdadeiros burlões que lhes diziam que o que sentem naturalmente, é errado.
Contranatura.
Um pecado.
Uma vergonha.

Talvez me enerve mais, porque numa altura da minha vida, também eu quis ser normal.
Porque eu já tive o mesmo medo que eles.

Lembro-me como se fosse hoje, de ser um miúdo assustado, nos meus 15 ou 16 anos, desastrado desengonçado e desenquadrado, e querer desesperadamente ser heterossexual.
Porque seria tudo melhor se não fosse gay.

E a verdade, é que se, naquela altura, se me oferecessem uma promessa de conversão, uma forma de me tornar 100% hétero, uma... cura eu tomava.
Porque ninguém me dizia que ser gay não é doença, nem uma anormalidade.

Não queria ter de lidar com os constantes “paneleiro”, “maricas”, “bicha” que eram soltos (com aquele veneno que só adolescentes hormonais conseguem libertar) à minha passagem.
E vivendo numa comunidade não muito recetiva, sem grande acesso a informações ou pessoas com as quais partilhar estas aflições, achava que tinha um problema, era a única explicação.
Porque ser gay não estava na moda na altura. 
Cá em baixo no sul não se viam casais na rua e tampouco nas novelas.

Desenvolvi uma carapaça de sarcasmo e uma resposta rápida que ainda hoje se aciona mal me sinto desconfortável, para não deixar que me vissem em baixo.
E tentava agir de forma máscula – o que obviamente nunca resultava, dando azo a ainda mais gozo – não usava cores vivas, não me preocupava com o cabelo, e vestia a roupa toda 2 tamanhos acima, tudo numa tentativa triste de ser hétero... ou pelo menos de não repararem em mim e me deixarem em paz.
Tentava ter namoradinhas, e ignorar a atração natural que sentia pelos colegas jeitosos que faziam capoeira na minha turma, e as tentativas de paixonites pelas amigas – que eram sempre coisas platónicas – eram constantes.

E vivi assim uns anos, sempre reprimido pelas mesmas vozes que me diriam que precisava de me curar.
Eventualmente cresci e percebi que não havia nada de errado comigo.

Eu sou o Miguel, tenho 24 anos e sou gay.
Para vocês que estão a ler, isto é uma afirmação chata e desnecessária – quanto muito, pelo título deste blog - ... mas para mim é sempre libertador, a primeira vez que digo isto a alguém, e não me sinto mal com isso.

É a minha cura pessoal.

35 comentários:

  1. Que super, Miguel!

    E o sol brilhará todos os dias. :-)

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    1. Esperemos que sim Inefável, a ver se ganho bronze :P

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    2. Para ti é fácil que moras perto da praia. Também quero :'(

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    3. Eu tenho sempre bronze á trolha o ano todo Horatius :((

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    4. Porque queres. Vives perto do mar, não tens desculpa... LOL

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    5. A minha pele não apanha sol decentemente, não sei pq, defeito de fabrico xD

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    6. Andas vestido. É por isso que se apanham bronzes à trolha... lolol

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  2. e espero que te sintas orgulhoso de ti :)

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    1. Tem que ser, já diz o RuPaul "If you can't love yourself, how in hell are you going to love somebody else?"

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  3. r. adorava saber responder-te a essas perguntas todas!

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  4. Fazendo um pouco uma afirmação ao estilo de Paulo Coelho, todos nós somos moldados para ser "hetero". E quando na verdade não o somos, temos um percurso a percorrer, com muitas quedas e com muitos becos sem saída, que nos fazem ter de voltar atrás. E é assim que se cresce. Eu tive uma adolescência infeliz. Porque não me aceitava, como tu. E descobri a chave da felicidade quando me consegui aceitar (o que foi uma coisa muito gradual). E hoje sou feliz, apesar de todos os contratempos que a vida me trás, por uma razão: conheço-me e aceito-me.

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    1. Eu não acho que nós sejamos moldados para ser héteros, é mais a sociedade que está feita para acomodar os héteros como padrão normal e preferencial. Daqui a 20 anos talvez não seja visto desta forma, mas por agora é mais uma questão de todas as referencias que recebes na tua vida, serem direccionadas aos heteros (ou pelo menos a maioria) sejam elas filmes, revistas, imagens de catálogos ou até personalidades que sirvam como inspiração. e quando nasces gay (ou bi, ou trans, whatever), é como se nascesses quadrado e te quisesses encaixar num assento redondo., porque pensas que tens que te encaixar ali.
      Desde que nos aceitemos, tudo se torna muito mais fácil. o pior é mesmo chegar lá :P

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    2. É o tal caminho...
      Não és moldado para ser hetero? Não te perguntam pelas namoradas?

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    3. Já perguntaram mais, honestamente xD agora acho que estão a entrar na fase de aceitação que daqui não sai namorada nenhuma.

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    4. LOL
      Pois, não te das com essas coisas... lolol

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    5. Como diz a outra "não gosto de escaranfunchar no mexilhão" xD

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    6. Eu não queria ser tao direto, Miguel... lol

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  5. o que importa é que te sintas bem contigo mesmo. que importa os haters, são do género de seres (também conhecidos como pessoas sem alma, pois perdem mais tempo a criticar a vida dos outros do que a viver a sua própria) que se formos a ver bem, estiveram na nossa vida durante uns segundinhos apenas. temos é que ser felizes e ligar apenas às opiniões de quem nos conhece bem (família, verdadeiros amigos, essencialmente).

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    1. É isso mesmo. As pessoas generalizam muito, e querem que toda a gente goste delas, para mim desde que as "minhas" pessoas gostem de mim, é quanto me baste. Ainda assim, mesmo a família, é um assunto muito delicado, pelo menos nesse aspecto... :)

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    1. É uma fase que já passou (e acho que alguns já passaram pelo mesmo) e que sabe muito bem deixar pra trás :)

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  7. falaste na moda do ser gay...há uns tempos estava a comentar isso com uma amiga...no meu tempo (loool) se algum rapaz andasse vestido de acordo com as tendências de moda atuais, era apontado, apelidado e humilhado...hj em dia, estranho é ser como se era, lá está, no meu tempo. E tb, as gerações mais novas do que a minha são bemmmmm mais ousados, e assumem o que querem, o que são, marcam a sua existência, essa parte eu admiro e acho muito positivo.

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    1. Yah, concordo com a teoria d"o teu tempo" ahah.
      Há uma fina linha entre "ousado" e "exibido" acho que até me deste ideia pra um post :P

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  8. é, sou uma 'ssoa muito inspiradoira :-P
    há que ver o lado positivo em tudo...:-)

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  9. 24 ANOS??????????? És uma criança PORRA! lolololol

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    1. Fresco que nem uma alface, veja lá :P (daqui a uns meses são 25 ;-; não quero, quero ficar jovem forévére)

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    2. Sim Namorado! quero daquela água da cabala que a mdonna toma, com água de embalsamento, para chegar aos 50 e me darem 25.

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  10. A fase da adolescência é terrível para muitos gays. As crianças e adolescentes podem ser muito cruéis, e isso arruina a autoestima de qualquer um, com traumas que por vezes ficam para toda a vida. Os meus parabéns aos que conseguiram passar essa fase difícil e tornarem-se adultos sensatos, têm todo o meu reconhecimento, ainda que por vezes tenham de saltar o portão a meio da noite.

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  11. Bem, todos nós fazemos o nosso caminho e todos nós já passamos por isso que dizes...

    A mim aconteceu-me. Tentei à força toda não ser gay, como se isso fosse possível. Isto é triste mas é verdade. Hoje estou substancialmente à vontade com quem sou e em quem eu me tornei. E isso é que é preciso! ;D

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(sou ótimo a motivar as pessoas hein?)